sexta-feira, 12 de julho de 2013

AS PALAVRAS

Crônica
Por Rogério Ribeiro







Na noite fria de um inverno incômodo, ela chegou dos afazeres diários, à sua amável casa e a si mesma.



O que se permitira nas manhãs daqueles últimos meses era o contar das histórias que faziam nela a ideia de dias de protagonista, onde, do lado de fora, seria a mais feliz na aventura que contava.


E o dia seguia...



Nela, os encantos pelas vozes diversas que saiam de sua garganta, faziam brotar o que em seu intimo havia sido plantado e que ninguém e nem ela mesma, sabia.



Era comum durante o dia, quando ressurgiam e reverberavam em sua mente e corpo as palavras daquelas manhãs, a lembrança lhe tomar a vista e já não mais saber ela, a hora de descer do ônibus, ou sair das compras...

As histórias haviam lhe tomado, enquanto as personas; varias, diversas e por muitas vezes desconhecidas, ainda lhe acompanhavam até nas noites em que não dormia só...

Adoráveis, esses personagens febris que discutiam com ela noite adentro... 
Não se importavam em dormir ou não... nem ela.

Dia após dia, as palavras haviam lhe trazido um mundo tão intenso, que lhe faltava o ar por entre as vírgulas... As paradas do veiculo tremulante; bruscas, no transito sombrio, fora das páginas do livro em suas mãos, não lhe tirava a ideia:

“Esta noite, me darei a elas mais do que poderia me dar a algum humano; Dar-me-ei, entre paginas e folhas, entre livros e a pena...  Que seja eu entregue às minhas palavras, sejam elas, acidas, cheias de sarcasmo e ironia, ou engraçadas e gaiatas...  Se forem, pausadas pela emoção, ou agitadas por meu rubor intenso, não me importa...  O siso me diz que devo brincar às vezes... A artista tímida que retém o medo, deverá em mim, por minhas palavras, permitir-me a ingenuidade moleca dos fins de aula... Séria, serena e sem regras, serei a  escritora de minhas histórias ....”


 Na noite fria de um inverno de ideias ao seu redor, ela, alegre, preparava  a “pena”, o bloco, e a poltrona, enquanto aquecia o leite e sorvia o chocolate na caneca companheira...

Recostando-se,  ela já estava pronta; com tudo à mão...


As ideias? 
As ideias sairiam todas; da mente, do peito... Até do estomago aquecido... 
Todas elas, certeiras, sairiam... 
Todos os dias... Dos movimentos faceiros de suas mãos.  
 




 
Atendendo ao pedido de um, mais que querido professor, esta crônica foi feita em homenagem às mulheres contadoras, que contam as histórias de outros, enquanto contam de si, em todas elas...

A elas, que sejam além de escritoras, contadoras, para um mundo sem conta de sua beleza.  




Rogério Ribeiro.



quinta-feira, 4 de julho de 2013

ENTRE TANTOS

Conto 
por Rogério Ribeiro









Em um pequeno país já inexistente, um homem vivia e revivia os direitos, deveres e até, os rumores de que falavam tanto, as pessoas que com ele dividiam a vida na também pequena cidade adorável, feita com esmero pelas mãos hábeis e certeiras do Rei daquelas terras.

No entanto, a aprazível cidade fora tomada por ladrões que se faziam de conquistadores de intentos ao humilde povo.

Já não era a mesma, a doce cidade cujo o pobre homem vivera desde a mais tenra idade.

Pobre, porque apesar do conceito e crença dos que coabitavam com ele em seu tempo, ele se enfadava em sofrer a ideia de que era completo; sandices e dejetos, por assim dizer, eram o que na verdade, saiam de suas gargantas.

Eles não sabiam certamente, quem  era e o que era, o homem que para si mesmo, era o homem pobre, que lhes conto.

Entre tantos outros, de formas e feitos diversos e muito além do que conseguiria pensar em querer ser, estava ele, vivendo feliz por onde podia e até queria, apesar de não querer muito, porque não poderia ir muito além.  

Não era tão completo.  Não era tão, o que diziam que era.

Mesmo assim, deixava com que acreditassem, ser ele, o produto que finalizaram em sua vã compreensão.

A cidade, cercada por aspirantes a hábeis ladrões perversos, rendeu-se; Tomaram-na e fizeram nela o que quiseram enquanto não chegava ainda aos ouvidos do soberano Rei, que uma de suas amadas cidades corria perigo.

Imediatamente, quando ouviu, o Rei deu ordens aos seus, que não fossem poupados, nenhum dos que se atreviam tentar roubar o que lhes era devido; a paz de buscarem além do que queriam, o que mereciam ter.

Em direção à terra amada, soldados armados e revigorados, seguiam em tropas, rumo à retirada dos que a importunavam. O Rei que ia à frente de todo o exército, pronto a restabelecer o curso da vida que tanto preservara,  estava certo de que o direito de seus súditos, seria retomado.  

Na terra confusa por roubos diversos ao povo e a seus sonhos, o homem pensava que seria impossível agora, reaver o detalhe que morava discreto em sua vida; eram saqueados dos viventes daquela terra, os bens adquiridos, enquanto os conquistadores falavam de suas  inversas conquistas na entrada da cidade. Extasiada, a multidão se entregara e  absorta, parava para vê-los em seus falsos atos... Haviam se  despercebido de que eram ladrões.

Com olhos arregalados, viam como a um espetáculo, as falas dos falsários enquanto suas casas eram subtraídas e mulheres, crianças e indefesos, eram levados.

O homem, estacionado entre a fala e o pensamento, via e só faltava desfazer-se para não ser e não mais ver o que se passava na terra perdida.

O povo, preso pelos olhos aos artefatos ilusórios, que os ladrões, lançavam aos céus, não mais se incomodava  quando via  sair pelas ruelas, os seus comparsas levando embora todo o seu trabalho e futuro.

Quando pode voltar a si, o homem concluiu em seu estado que estava perdida a ideia de que seria completo entre tantos outros incompletos e que nem se davam conta. 

Por que, diante de tanta e complexa dúvida, se atreveriam a viver ainda, os que não confrontavam os abutres que aviam pousado por  lá e que aos poucos, arrancariam-lhes tudo?

Ele não sabia... 

E, por não saber, parou para contemplar com atenção o restante do ocaso da cidade feliz. 

Ele não era mais, o mais importante...  Nem para si.

Diante de seu corpo estático, era morto um dos poucos que lutavam e que ainda se davam o espaço para se preocupar com ele e sua incompletude... Foi morto ali, enquanto a multidão, mais adiante, festejava o engodo do qual nunca sentira falta, até então.

Então, ele saiu por entre a multidão, carregando as dores que pareciam ser a de todos os que se inebriavam pela luxúria que pouco conheciam.  Andou; na esperança de não mais vê-la, exposta em seus rostos sorridentes de olhos cegos. 
Não os veria quando deixasse a cidade.

Ao sair pelos grandes portões, ninguém o viu a não ser o Rei que vinha pelo caminho.

Ao ver o homem, mandou que parassem o carro, enquanto o comandante seguiu adiante com a tropa, em busca da cidade e sua nobreza perdida.  

O homem ali,  perplexo diante do que vira disse ao Rei:

- Majestade, alguns... Foram mortos... TODOS...foram saqueados!  De todas as formas... Todos! 

 - Você se restabelecerá... E não se lembrará, mais deste dia...  Respondeu o Rei olhando fixamente nos olhos do homem exausto.

Abaixando a cabeça, o homem respondeu com lágrimas:

- O único amigo...  O único... Foi morto... Diante dos meus olhos! O que ainda se importava,... Foi ceifado... Agora, não tenho mais quem se importe!

O Rei então, levantando o rosto do pobre homem, respondeu:  

- Filho;  Eu sou o seu Rei... Se não amasse o meu povo não haveriam exércitos para defendê-lo, ou esta cidade que construí... Quem ama a um país inteiro, pode muito, cuidar de um só homem...  

... Eu sou o seu Rei!